Blog

Notícias >

Blog

Notícias >

Blog

Notícias >

11h55

Da insegurança jurídica dos efeitos da Resolução CONAMA sobre Exploração de Recursos no Bioma Pantanal

Compartilhe
Tamanho do Texto

Na última semana o Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA) decidiu, por unanimidade, retirar da pauta a votação da minuta da Resolução que dispõe sobre os critérios técnicos e científicos para fundamentação de exploração dos recursos naturais do bioma Pantanal, com potencial efeito direto e suspensivo de todas as licenças de supressão de vegetação nativa alcançados pelo bioma Pantanal, nos Estados do Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, somado ao impacto expressivo para atividade agropecuária na região, cujo bioma representa uma área de aproximadamente 9,73 milhões de hectares, correspondendo a 27% do território total, sendo 87,5% de cobertura natural.

A contenda tem em seu cerne a divergência interpretativa sobre o art. 10 do Código Florestal Brasileiro (Lei Federal nº 12.651/2012), que trata da exploração ecologicamente sustentável das áreas de uso restrito nos pantanais e planícies pantaneiras. De outro lado, o texto propositivo da Resolução do CONAMA, embasado pela Nota Técnica 762/2023-MMA que elenca recomendações transcendentes ao disposto nas normativas estaduais, dentre elas Decreto Estadual do Mato Grosso do Sul nº 14.273/2015 e, no Estado do Mato Grosso, a Resolução do Conselho Estadual de Meio Ambiente nº 45/2022 bem como a Lei Estadual nº 8.390/2008, modificada pela Lei Estadual nº 11.861/2022.

Preliminarmente, cabe ressaltar a natureza jurídica do Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA), sendo órgão consultivo e deliberativo vinculado ao Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA), cuja competência se limita a deliberação sobre políticas nacionais e diretrizes ambientais, bem como a fixação de normas e critérios para o uso sustentável dos recursos naturais e a preservação do meio ambiente, cuja formalização se dá por meio de Resoluções. Sendo, portanto, órgão que estabelece orientações não vinculantes, mas, orientativas, sujeitas às limitações impostas pelo arcabouço legislativo ambiental brasileiro.   

Nesse contexto, quanto à tutela jurídica do bioma Pantanal, a Constituição Federal de 1988, em seu artigo 225, § 4º, prevê que algumas porções do território nacional – Floresta Amazônica, Mata Atlântica, Serra do Mar, Pantanal Mato-Grossense e Zona Costeira – são consideradas patrimônio nacional, devendo seu uso ocorrer na forma da lei e em consonância com sua preservação ambiental, bem como o supracitado art. 10 da Lei Federal nº 12.651/2012 que trata sobre áreas de uso restrito no bioma em análise, in verbis:   

Art. 10 - Nos pantanais e planícies pantaneiras, é permitida a exploração ecologicamente sustentável, devendo-se considerar as recomendações técnicas dos órgãos oficiais de pesquisa, ficando novas supressões de vegetação nativa para uso alternativo do solo condicionadas à autorização do órgão estadual do meio ambiente, com base nas recomendações mencionadas neste artigo. (Redação dada pela Lei nº 12.727, de 2012). 

Em que pese as recomendações técnicas dos órgãos oficiais de pesquisa, o legislador deixa claro que o fato gerador em questão (supressão de vegetação nativa para uso alternativo do solo), está condicionada à autorização do órgão estadual, hoje regulamentada pelo art. 14 do Decreto Estadual nº 14.273/2015, no Estado do Mato Grosso do Sul, que estabelece que para a supressão de vegetação nativa, a relevância ecológica deverá ser considerada com o intuito de resguardar amostras representavas da diversidade dos pós de vegetação (fitofisionomias), existentes na propriedade rural inserida na Área de Uso Restrito da planície inundável do Pantanal, mantendo-se o percentual igual ou superior a 50% nas áreas de cerrado e formações florestais, bem como o percentual de 40% nas áreas de formações campestres.

No estado do Mato Grosso, a principal legislação que regulamenta a proteção do Pantanal é a Lei Estadual nº 8.390/2008, modificada pela Lei Estadual nº 11.861/2022, que dispõe sobre a Política Estadual de Gestão e Proteção à Bacia do Alto Paraguai e faz menção em seu art. 9º, §4º à necessidade de se garantir a heterogeneidade ambiental e a funcionalidade nas paisagens pantaneiras quando da exploração e uso do bioma.  

Sob o ponto de vista prático, a normativa do Estado do Mato Grosso impõe um limite máximo de 40% da área da propriedade rural na planície inundável do Pantanal para a implantação das pastagens cultivadas, a fim de viabilizar a conversão para uso alternativo do solo desde que atendidos os critérios estabelecidos na legislação estadual bem como nas diretrizes gerais elencadas no Código Florestal, sob o fundamento legal de se constituir em um direito do proprietário do imóvel. 

Apesar da ausência de legislação federal específica para tratar sobre o bioma pantanense, as normas estaduais deixam claro o alcance do órgão competente para construção discricionária na fundamentação da sua decisão acerca de eventual autorização de supressão de vegetação nativa, devendo ser cumprido, com fulcro na autonomia e independência legislativa dos entes federados.  

Sob outra ótica, a proposição de Resolução do CONAMA tem como fundamento principal as análises e conclusões de Nota Técnica 762/2023-MMA, emitida em maio deste ano pela Secretaria Nacional de Biodiversidade, Florestas e Direitos Animais do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA), que evidenciam a lacuna sobre o conceito de “exploração ecologicamente sustentável” da Lei Federal nº 12.651/2012, além da ausência do termo “exploração” no rol de fundamentos dos órgãos de pesquisa mencionados.    

Dentro do evidente contexto de lacuna e omissão, a proposta irrazoável da Resolução do CONAMA quanto a suspensão imediata e temporária, por parte dos Estados, da vigência de supressão de vegetação nativa ou de uso alternativo do solo, motivada pela inexistência ou a não utilização de estudos atuais e consistentes com os parâmetros definidos realizados por instituição oficial de pesquisa de renome nacional, extrapola os limites estabelecidos pela Lei Federal nº 12.651/2012, em clara afronta a autonomia e independência dos entes federativos para legislar.  

Na mesma linha, a proposta do art. 4º da Resolução destaca que caberá ao Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima apoiar, no prazo máximo de um ano, a realização de uma avaliação ambiental estratégica sobre a integridade ecossistêmica do Pantanal em face das normas federais e estaduais vigentes, das dinâmicas de expansão dos desmatamentos e dos compromissos brasileiros relativos à agenda climática e de biodiversidade com a finalidade de contribuir para o aperfeiçoamento normativo relativo ao uso e exploração sustentável dos seus recursos naturais.  

Não obstante a relevância da atualização e do aperfeiçoamento do sistema normativo ambiental, caberá ao poder competente (legislativo) exercê-lo, seja no âmbito federal ou estadual, no que tange a elaboração de leis. Outrossim, a avaliação sobre a compatibilidade das normas federais e estaduais vigentes, condicionada ao prazo de 12 (doze) meses estabelece um ambiente de insegurança jurídica e prejuízo imensurável para o setor agropecuário na região, em virtude de eventual sobrestamento da licença para supressão de vegetação, em clara violação ao direito de defesa e do devido processo administrativo legal.      

Portanto, apesar de ter sido retirada de pauta, a Resolução segue pendente de análise e votação pelo CONAMA, e apesar do caráter orientativo e não vinculante do órgão deliberativo, pode abrir precedente para um ambiente de insegurança jurídica sobre o Código Florestal Brasileiro e legislação ambiental no âmbito dos Estados.  

Para tanto, o debate emerge como importante oportunidade para construção legislativo na esfera federal quanto a exploração sustentável de áreas de uso restrito do bioma Pantanal e sobre a definição do conceito para “exploração ecologicamente sustentável”, considerando a complexidade multifatorial do bioma pantaneiro, lastreado por uma abordagem técnica e normatização uníssona e holística, fruto de processo legislativo razoável e transparente,  a fim de garantir as condições que assegurem a preservação do meio ambiente quanto ao uso dos recursos naturais, em sinergia ao aproveitamento ambientalmente correto das potencialidades que o bioma proporciona para o desenvolvimento do país.

 

Marcela Pitombo e Mariama Penna

2021 - 2024. Mosello. Todos os direitos reservados.
Produzido por: Click Interativo - Agência Digital

Usamos cookies para armazenar informações sobre como você usa o nosso site e as páginas que visita. Tudo para tornar sua experiência a mais agradável possível. Para obter mais informações, consulte a nosso política de privacidade e nossa política de cookies. E para entender os tipos de cookies que utilizamos, clique em Opções. Ao clicar em Aceito, você consente com a utilização de cookies.

Aceito Opções

Definições

Queremos ser transparentes sobre os dados que nós e os nossos parceiros coletamos e como os utilizamos, para que você possa controlar melhor os seus dados pessoais. Para obter mais informações, consulte a nossa política de privacidade e nossa politíca de cookies.

O que são cookies?

Cookies são arquivos salvos em seu computador, tablet ou telefone quando você visita um site.

Usamos os cookies necessários para fazer o site funcionar da melhor forma possível e sempre aprimorar os nossos serviços.

Alguns cookies são classificados como necessários e permitem a funcionalidade central, como segurança, gerenciamento de rede e acessibilidade. Estes cookies podem ser coletados e armazenados assim que você inicia sua navegação ou quando usa algum recurso que os requer.

Gerenciar preferências de consentimento
Cookies de análise

Utilizamos softwares analíticos de terceiros para coletar informações estatísticas sobre os visitantes do nosso site. Esses plugins podem compartilhar o conteúdo que você fornece para terceiros. Recomendamos que você leia as políticas de privacidade deles.

Bloquear / Ativar
Google Analytics
Necessário
Cookies estritamente necessários

São aqueles que permitem a você navegar pelo site e usar recursos essenciais, como áreas seguras, por exemplo. Esses cookies não guardam quaisquer informações sobre você que possam ser usadas em ações de comunicação de produto ou serviço ou para lembrar as páginas navegadas no site.

Bloquear / Ativar
Site
Necessário